ND do Pântano do Sul

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terça-feira, 16 de julho de 2013

A ORLA E A BURLA



Em evento com grande pompa e estilo foi lançado no dia 09.07.13 à noite, no
auditório da Justiça Federal, em Florianópolis, o Projeto Orla voltado para nossa cidade, evento no qual se engajou o Ministério do Turismo, órgão federal até então ausente no ‘arcabouço institucional’ que o promove. O prefeito Cezar Souza Jr. Fez se presente, mas depois do discurso logo se ausentou, como soe fazer nos últimos tempos, pois parece que não gosta de ouvir vozes dissonantes na trilha sonora do seu onipresente marketing político ainda em frenético ritmo de campanha eleitoral.

O escopo/moldura do projeto é uma repetição do mesmo que se vê em toda parte. Faz semelhança com o PDP, dentre outras iniciativas recentes, ao criar um ‘ente gestor’, por exemplo, chamar a participação comunitária para oficinas (lembram a ‘leitura comunitária’ do PDP) e estabelece um vasto calendário de atividades que culminarão em fins de 2014 com um relatório apontando conclusões e produtos – as propostas para a ocupação da orla marítima na cidade que perfaz redondos 230km,o que não é pouca coisa até mesmo em termos de Brasil.

E assim como no PDP, o projeto contratou ‘consultores/monitores’ para executar profissionalmente sua metodologia, que já vem pronta, aliás, bem ‘quadradinha’.

Esta, no entanto, não é novidade alguma, ao contrário de como é apresentada pelos promotores. É uma velha fórmula, ainda que pouco utilizada no Brasil, urdida nos laboratórios de sociologia política na Europa e nos EUA, visando apenas um objetivo maior – a busca de um ‘consenso político’ nas comunidades em torno da ocupação da orla, um espécie de ‘pacto político’, como se salienta no projeto. Esse consenso, como se sabe, não é possível no âmbito de uma sociedade capitalista, altamente segmentada como a nossa, que vive permanente conflito entre os atores sociais. É falso, portanto, impor um consenso, coisa até mesmo impossível. Seria possível, por exemplo, chegarmos a um consenso com a Hantei em torno da criação do parque urbano sobre a área de seu domínio, a Ponta do Coral?

Mas o que mais chama atenção na apresentação do projeto é o arranjo institucional providenciado para levá-lo adiante, pois traz para sua execução toda a equipe técnica da PMF envolvida nos trabalhos do PDP, que carece de tudo, de estrutura física, técnica, dinheiro, etc..., e que, justo em função desses ‘sólidos argumentos’, alegam os dirigentes municipais não ser possível dar pleno curso ao processo do PDP, atolado em marasmo já faz meio ano. É evidente que todo esse envolvimento responde a uma ‘prioridade política’ da gestão municipal, diante de outras questões e processos em andamento, visto que os argumentos alinhavados acima são
claramente falaciosos, pois há sim dinheiro, há sim equipe técnica como se vê para tocar um projeto que, na melhor das hipóteses, ocupará um ano e meio de ações.

De outra parte, na noite da apresentação, os representantes da PMF, do projeto e os consultores contratados tiveram sérios problemas para responder ao questionamento de como se dará o ‘acoplamento’ desse projeto com o processo em curso do PDP – acenaram com uma vaga resposta de que não haverá constrangimento às decisões tomadas no âmbito do PDP nas audiências públicas distritais, e que o detalhamento produzido para a orla não conflitará com o que for decidido no âmbito do mesmo, seja no antes, durante ou depois de findado o processo participativo e legislativo.

Estamos, pois, diante de uma clara inversão de prioridade no que tange ao
planejamento urbano na cidade – o Projeto Orla toma o lugar do PDP que, assim como em passado não tão remoto, mais uma vez é ‘empurrado com a barriga’ em evidente processo de deliberada ‘procrastinação político/administrativa’, ainda que bastante dissimulada pela retórica marqueteira trombeteada pelo governo.

A óbvia pergunta que surge é: porque não terminar de uma vez por todas o PDP e depois, na seqüência executar o Projeto Orla? É mais lógico e coerente antes definir o ‘macro-desenho urbano’, que é o PDP, para depois avançar sobre o micro, a orla, que só responde a uma ínfima parte do território municipal, e adequando o micro ao macro anteriormente estabelecido, não o contrário como agora se insinua.

A PMF, por sua vez, passado meio ano em nova gestão, não deu qualquer sinal de nova proposta para o texto do anteprojeto do PDP, o qual havia anunciado em evento com igual pompa em 25 de abril no auditório da CASAN, assim como, além de transformar o Núcleo Gestor Municipal em mera ‘peça decorativa’, também não desenvolveu qualquer novo trabalho técnico em torno dos mapas de condicionantes ambientais e outros necessários para dar seguimento ao PDP. Isso evidencia, junto
com o recém lançado Projeto Orla, que o PDP deixou de ser prioridade política para a administração, para delírio do setor da construção civil e aviltamento ainda maior da tragédia urbana que a cidade vive desde há muito – com um Plano Diretor caduco e retalhado por 400 emendas de zoneamento urbano a partir de 1997.

É chegada a hora de realmente dar um basta à situação que vive o PDP, cobrando energicamente uma posição clara da PMF sobre o desfecho desse processo que se arrasta desde 2006, e que somente dela depende para ser finalizado e virar lei, a despeito das propostas levadas ao Núcleo Gestor Municipal por representações distritais e entidades, e solenemente ignoradas. A responsabilidade sobre isso recai sobre os ombros do prefeito que tem dar mostras práticas, e não apenas dizer, do que pretende realmente encaminhar enquanto PDP nos próximos meses.

A ver pelo agora ‘prioritário’ Projeto Orla, parece que mais uma vez Florianópolis não verá a revisão do Plano Diretor se consumar tão cedo. E o mais inacreditável dessa verdadeira ‘novela kafquiana’ parece ser o fato de que outras autoridades públicas não cobram da PMF a finalização do PDP, o que deveriam fazer com os poderes que lhes foram legalmente conferidos. A história cobrará o seu preço a todos os envolvidos, pois é inadmissível conviver impassível diante da ‘novela mexicana’ que esse processo gerou ao longo de sete anos, algo inusitado em todo o país e só possível por via de elementos realmente ‘mágicos’.

Florianópolis, na ‘ilha da magia’, em julho de 2013
Gert Schinke
Membro titular do NGM-PDP pelo Distrito do Pântano do Sul, Presidente-Executivo do Instituto Para o
Desenvolvimento de Mentalidade Marítima – INMMAR, Coordenador Geral da FEEC – Federação das
Entidades Ecologistas Catarinenses, autor do livro ‘Ecoplamento – a teoria que explica o processo de

assimilação do colapso ecológico por parte do sistema capitalista global’ (Editora Insular – 2013)

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