Em evento com grande pompa e estilo
foi lançado no dia 09.07.13 à noite, no
auditório da Justiça Federal, em
Florianópolis, o Projeto Orla voltado para nossa cidade, evento no qual se engajou o
Ministério do Turismo, órgão federal até então ausente no ‘arcabouço institucional’
que o promove. O prefeito Cezar Souza Jr. Fez se presente, mas depois do
discurso logo se ausentou, como soe fazer nos últimos tempos, pois parece que não gosta de
ouvir vozes dissonantes na trilha sonora do seu onipresente marketing político
ainda em frenético ritmo de campanha eleitoral.
O escopo/moldura do projeto é uma
repetição do mesmo que se vê em toda parte. Faz semelhança com o PDP, dentre
outras iniciativas recentes, ao criar um ‘ente gestor’, por exemplo, chamar a
participação comunitária para oficinas (lembram a ‘leitura comunitária’ do PDP) e
estabelece um vasto calendário de atividades que culminarão em fins de 2014 com um
relatório apontando conclusões e produtos – as propostas para a ocupação da orla
marítima na cidade que perfaz redondos 230km,o que não é pouca coisa até mesmo
em termos de Brasil.
E assim como no PDP, o projeto
contratou ‘consultores/monitores’ para executar profissionalmente sua metodologia, que
já vem pronta, aliás, bem ‘quadradinha’.
Esta, no entanto, não é novidade
alguma, ao contrário de como é apresentada pelos promotores. É uma velha
fórmula, ainda que pouco utilizada no Brasil, urdida nos laboratórios de
sociologia política na Europa e nos EUA, visando apenas um objetivo maior – a
busca de um ‘consenso político’ nas comunidades em torno da ocupação da orla,
um espécie de ‘pacto político’, como se salienta no projeto. Esse consenso, como
se sabe, não é possível no âmbito de uma sociedade capitalista, altamente segmentada
como a nossa, que vive permanente conflito entre os atores sociais. É falso,
portanto, impor um consenso, coisa até mesmo impossível. Seria possível, por exemplo,
chegarmos a um consenso com a Hantei em torno da criação do parque urbano sobre
a área de seu domínio, a Ponta do Coral?
Mas o que mais chama atenção na
apresentação do projeto é o arranjo institucional providenciado para levá-lo adiante,
pois traz para sua execução toda a equipe técnica da PMF envolvida nos trabalhos
do PDP, que carece de tudo, de estrutura física, técnica, dinheiro, etc..., e
que, justo em função desses ‘sólidos argumentos’, alegam os dirigentes municipais não
ser possível dar pleno curso ao processo do PDP, atolado em marasmo já faz meio
ano. É evidente que todo esse envolvimento responde a uma ‘prioridade política’
da gestão municipal, diante de outras questões e processos em andamento, visto
que os argumentos alinhavados acima são
claramente falaciosos, pois há sim
dinheiro, há sim equipe técnica como se vê para tocar um projeto que, na melhor das
hipóteses, ocupará um ano e meio de ações.
De outra parte, na noite da
apresentação, os representantes da PMF, do projeto e os consultores contratados
tiveram sérios problemas para responder ao questionamento de como se dará o
‘acoplamento’ desse projeto com o processo em curso do PDP – acenaram com uma
vaga resposta de que não haverá constrangimento às decisões tomadas no âmbito
do PDP nas audiências públicas distritais, e que o detalhamento produzido para
a orla não conflitará com o que for decidido no âmbito do mesmo, seja no antes,
durante ou depois de findado o processo participativo e legislativo.
Estamos, pois, diante de uma clara
inversão de prioridade no que tange ao
planejamento urbano na cidade – o
Projeto Orla toma o lugar do PDP que, assim como em passado não tão remoto, mais
uma vez é ‘empurrado com a barriga’ em evidente processo de deliberada
‘procrastinação político/administrativa’, ainda que bastante dissimulada pela retórica
marqueteira trombeteada pelo governo.
A óbvia pergunta que surge é: porque
não terminar de uma vez por todas o PDP e depois, na
seqüência executar o Projeto Orla? É mais lógico e coerente antes definir o ‘macro-desenho urbano’, que
é o PDP, para depois avançar sobre o micro, a orla, que só responde a uma
ínfima parte do território municipal, e adequando o micro ao macro anteriormente
estabelecido, não o contrário como agora se insinua.
A PMF, por sua vez, passado meio ano
em nova gestão, não deu qualquer sinal de nova proposta para o texto do
anteprojeto do PDP, o qual havia anunciado em evento com igual pompa em 25 de abril
no auditório da CASAN, assim como, além de transformar o Núcleo Gestor
Municipal em mera ‘peça decorativa’, também não desenvolveu qualquer novo trabalho
técnico em torno dos mapas de condicionantes ambientais e outros necessários para
dar seguimento ao PDP. Isso evidencia, junto
com o recém lançado Projeto Orla, que
o PDP deixou de ser prioridade política para a administração, para delírio do setor
da construção civil e aviltamento ainda maior da tragédia urbana que a cidade vive
desde há muito – com um Plano Diretor caduco e retalhado por 400 emendas de
zoneamento urbano a partir de 1997.
É chegada a hora de realmente dar um
basta à situação que vive o PDP, cobrando energicamente uma posição clara da PMF
sobre o desfecho desse processo que se arrasta desde 2006, e que somente dela
depende para ser finalizado e virar lei, a despeito das propostas levadas ao
Núcleo Gestor Municipal por representações distritais e entidades, e solenemente
ignoradas. A responsabilidade sobre isso recai sobre os ombros do prefeito que tem
dar mostras práticas, e não apenas dizer, do que pretende realmente encaminhar
enquanto PDP nos próximos meses.
A ver pelo agora ‘prioritário’ Projeto
Orla, parece que mais uma vez Florianópolis não verá a revisão do Plano Diretor
se consumar tão cedo. E o mais inacreditável dessa verdadeira ‘novela
kafquiana’ parece ser o fato de que outras autoridades públicas não cobram da
PMF a finalização do PDP, o que deveriam fazer com os poderes que lhes foram
legalmente conferidos. A história cobrará o seu preço a todos os envolvidos,
pois é inadmissível conviver impassível diante da ‘novela mexicana’ que esse
processo gerou ao longo de sete anos, algo inusitado em todo o país e só possível
por via de elementos realmente ‘mágicos’.
Florianópolis, na ‘ilha da magia’, em
julho de 2013
Gert Schinke
Membro titular do NGM-PDP pelo
Distrito do Pântano do Sul, Presidente-Executivo do Instituto Para o
Desenvolvimento de Mentalidade
Marítima – INMMAR, Coordenador Geral da FEEC – Federação das
Entidades Ecologistas Catarinenses,
autor do livro ‘Ecoplamento – a teoria que explica o processo de
assimilação do colapso ecológico por parte do sistema
capitalista global’ (Editora Insular – 2013)
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